Nas Grécias os mitos vendem-se como ketchup
Desde que são decorativos
E não metem medo
Nem já rendem para a dívida cumprir
O transe agora é um dobrar a cerviz suado
Colorido pirotécnico
Os dentes na pose salarial
E os agiotas dormem menos
Desde que as greves se avizinham do parlamento
Têm medo das vozes do corpo
Já não se fala de Platão
Nem da caverna
Vêem tudo à primeira
Os filhos da crise
E não estão para essas ilusões
Sonhadas de sombras projectadas
Sombras chinesas sim
Pragmáticas mais do que qualquer confusão entre o real e um seu duplo
Enganador
Mundo de aparências quando o mundo real é clandestino
Um duplo como duplo mais que puro sósia
Duplos só uísques
O espectáculo apenas primeiro que a teta não confunde
É alimento desde que Hollywood é Olimpo
E telegenia demagógica
Nem estão eles
Nem estamos nós
Para suportar a poluição ideológica
Filoxera que corrói lá metida em pista falsa as colunas do Partenon
Pelo interior da sua lingerie de ligas ausentes
Pedra papiro pedaços da origem do que a poesia fundou
Em jogo voyeur e bicho do papel mil patas
A instaurar a catástrofe laboratorial
E nisso nos comprazermos
No jornal das nove
A inevitável queda diária
Nas quedas
Os juros não cantam doem
Na Grécia sempre se falou muito do pensamento
Mas agora fala-se a propósito
De vício de esplanadas
Como se os peripatéticos passeios
Não fossem esplanadas andantes
E fala-se de fora
De vocações de ócio sem redenção
De Retsinas de perdição
E que é necessário acabar com elas
Não produzem senão sol
E deslembrar de compromissos
Sorrir a quem quer comer mitos
E fritos
E mostra as coxas
Euro Americanas
Os gregos nisso são bestiais
Lojas de mitos recordações
Trouxas argilas corações
E as tropas do turismo
Nas suas sapatilhas cómodas
Para unhas encravadas e pé de atleta mental
Olham à hora
O à
La Minute que lhes fixa a eternidade
Num ápice
Um fundo calcário
No calendário
Com odor a Heraclito
Porque Heraclito nas suas contradições de fogo
Cheirava a pinhal e ao seu contrário
Mais que Sócrates cheirasse a respeito da lei
Quando para a cicuta o dispusessem
Eutanásia ética um pouco coxa dos tempos clássicos
Para educar efebos do regime dizem
E não sabemos se seria exactamente assim
Porque pintaram o Sócrates
Como quiseram com os pincéis da ordem
Conveniente e só nos resta gramar a verdade que os manuais foram Cobrindo do sarro que não sai
Zenão dobrava o joelho
Na mesma cena panorâmica
Em que Sócrates bebia a cicuta
E Platão olhava a projecção da cena da caverna no seu exterior
Primeiro cinema
Da metade de meio por meio
E a mio de outra metade interminável
Zenão fazia as contas
Ou qualquer porra no género
E era já um tecnocrata
Da geometria absurda
Infinidade da medida deslucro
Do fémur reincidente
E menina do olho desgastando-se
A palma da mão a metro esticada
De polegar a indicador
A dar a referência prática artesanal
Lentamente esculpida pela erosão
Que o vício transporta
Pelas noites inúteis fora
A nossa pachorra
Não se acomoda aos queixumes lacrimejantes
Da nova tragédia
Que todos os dias produz clímaxes
E faz cachas
E não há fígado que resista
Não se aguenta
Um quotidiano sempre de apocalipses
Para alka seltzer consumir
Como quem atura medíocres alcandorados na política a pessoas
E no parlamento a recém chegados à capital e ao capital
Um tornado é um tornado
E nos tornados
Os credores voam
Como qualquer outra merda
Papel por exemplo mesmo que carne
Ou ouro de lei
Esse que paga silêncios
Eis a natureza das coisas
Emílio Navarro Soler
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