terça-feira, 30 de agosto de 2011

Benjamim primo Saguate re-sempre,

Recebi sua missiva e estou atónito. Aqui também deu fenómeno de aluamento canino em matilha. Ninguém explica, nem político nem cientista, cientista tenta e vai no Xipamanine orbitar cabeça de macaco. Mas tem mais problema de cabeça quebrado, a minha prima Fina, de Manjacaze, te lembras-te? Aquela que tem amiga de poilão traseiro, rabo de batata do Entroncamento, duplo, lembras? Essa, também lhe deu de aluada na mesma hora, aquele rabo chunguila cantou de latir. O fenómeno canino é humano. Fica-se, cada um, na respectiva, a pensar que tem coisa catembada entre cão e humano e que, nos presentes, se calhar, caminhamos para uma nova divisa: o homem é o melhor amigo do cão. Tem bichomem que é cão, canibaliza até passarinho só osso, fatia de bunda, silêncio, até canibaliza papel, come rima sem saber, maiúsculas, como o que lhe vem, já vi um engolir uma gramática dos tempos. Sabe como canibaliza silêncio? Com rajada de tiro e tem mabandido polícia que tem arma bandido para roubo legal ilegal. Essa moscambilha, cão e bichomem, é mesmo de assustar até as pessoa em paz com os mortos. Já teve Neandertal, já teve Sapiens, já teve Neandertal com Sapiens e ainda tem alguns aí e se calhar esses Neandertais Sapiens fundidos é que aluam caninamente – eles andaram no cunza cunza aleatório e deu que resultado: cãohumano, soletra ladrares – tudo sem camisinha, quem que usa camisinha? Aquece a borracha e esfria a carne. Silicone tem tesão?
Esse assunto é complicado: tás a ver, primo, aquele Neandertal que tem lá na Macia? Esse, por exemplo, lembras ele? Esse comeu a amiga da prima do rabo que abunda e tem dupla melancia, este e oeste, rabo bússola - um rabo desses nunca se perde, podes ir no mato que rabo sinaliza, tem radar, é atraído pela força da gravidade para um eixo direccionado no bom caminho, de casa. Aparte: sabe que bunda vem d’abunda? Caiu o primeiro A. Esses A do princípio cai como dente de leite nas criança. Um mufanito fica sem dente de leite nos seis, não é, é como esse A.,m para ficar maiúsculo cai o minúsculo. Vaca fria: e desse cruzamento Neandertal com a amiga da prima – arrebentou no dia da marrabenta - deu esse início de novo tipo humano. E aí tem apocalipse do género com extinção de sapiens sapiens e mistura de Neandertal com bundismo mais homoconsumos, você sabe que tem maluco no cabeça quando vê cerveja, e que chama iss?
Essa amiga da Macia da bunda ela latiu por influência? Está contaminada desse rosnar Neandertal que caracteriza também o bichomem da política. Tem duas vias de regredir, a contaminada e a política. A contaminada mete gaita Neandertal, a política é com aldrabice grande. A minha prima que disse que nessa madrugada de cão aluado ela latiu também na mesma hora. Aqui também ouvimos. Esses cão ladraram aqui no Sul, em todo o Sul. Mesmo na Ponta do Ouro e até me disseram que na Nazaré, lá mesmo longe no rectangulozinho, também houve ladrares, na Nazaré eram matriarcais, rooms, chambres, zimers – o Neandertal nazareno aluga-se à hora. Esse fenómeno é preâmbulo de apocalipse. E quem salva? Quem tem reserva. Quem tem bunda que abunda. Essa amiga da prima, lembras? Essa tem reservas de bunda que até faz pensar em petróleo na traseira, petróleo de trás que não é refinado é bruto.
Benjamim, vai longa missiva, só uma linha: essa bunda faz sonhar investimento. Qual o juro?

Abraços Benjamim, do teu Xico Saguate, Xilunguíne Agosto de 2011

Caros javalis, esta mierda ainda vai acabar mal e não falo agora na qualidade de amante do administrador francês

A ministra do Trabalho alemã, Ursula von der Leyen, considera que a crise pode ser superada com a criação dos "Estados Unidos da Europa"
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segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Novo PREC chega em Setembro às escolas e isto é só uma amostra

“Educação: Sindicatos denunciam trabalho pago a 3 euros à hora

Os sindicatos da função pública denunciaram esta segunda-feira que o trabalho nas escolas e jardins de infância da rede pública é cada vez mais precário, dado o número de concursos abertos nas últimas duas semanas.”

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Nomeações

Acabo de ler que este governo já fez mais de quinhentas nomeações. E porque é que não espanta o feito e a rapidez? Nada se esperava de diferente. A velocidade das nomeações é superior à de Sócrates, considerando o período de tempo homólogo de início da governação. E o que é que nos diz este dado? Que são forças políticas do mesmo tipo. Mal se instalam no poder fazem tudo para se eternizar nele e a pressa de tudo controlar passa a ser programa – fora dele fazem o mesmo, o carácter permanentemente eleitoral (directo, eleitoral e indirecto, sob escrutínio mediático diário) do exercício do poder e do exercício de oposição, de reconquista do poder no caso, fazem da democracia um simulacro com dois protagonistas em alternância sistémica, já que nada se decide fora da gestão diária da fabricação simulada de uma identificação com o interesse geral, tudo o que acontece cada vez mais medido em função de uma quantificação estatística constante dos humores avindos e desavindos dos eleitores como reacção aos casos efémeros do que, finalmente, constitui a governação na esfera pública enquanto imagem dos próprios poderes e líderes.
Na realidade o governo hoje é a maior ou menor capacidade de organizar junto dos que de algum modo escrutinam a governação, o eleitorado e os poderes com força mediática de facto, a aceitação pacificada da melhor mentira acerca de cada caso – as artes de relativizar a verdade nunca foram tão acrobáticas e nisso os média e a sua ambivalência de estatuto, vozes de poder e vozes críticas, vão realizando o seu jogo duplo, por vezes na defesa de verdades evidentes e escarrapachadas, outras vezes na sua ocultação manhosa - já que os casos, na irracionalidade do sistema e suas erupções de imprevistos e na impossibilidade de uma concertação estratégica da mentira, se sucedem uns aos outros “obrigando” quem governa, não a governar, mas a dar em espectáculo explicações e tomar medidas para uma reinterpretação dos casos como afinal sendo culpa de outros, sempre terceiros e estranhos, bodes expiatórios uns, novos inimigos outros, sacrificados consentidos se necessário. O culpado é sempre um caso excepcional, alguém que degenerou, porque os outros são criaturas éticas e nada têm a ver com empresas nem negócios menos visíveis, o que a justiça sempre tardia comprova sempre por ausência de concretização dos processos legais, ora prescrevem, ora são tão longos que apodrecem morrendo a culpa mesmo que não solteira pelo esmorecimento da memória. Onde andará Dias Loureiro, por exemplo? Não era próximo do Presidente Cavaco, membro do Conselho de Estado?
A maior parte do esforço de governação das forças ultra liberais é dedicarem-se à sua própria perpetuação no poder. E isso significa governar para o partido e neste caso para a coligação de poder. O que explica o número obsceno de nomeações em tão breve período. Será que quota do CDS respeita a sua percentagem e isso ajuda a explicar o número amplo? A coligação será essa? Tudo indica que quanto à aritmética dos proveitos clientelares são competentes. É a lei da proporção no usufruto do poder concreto, és mais pequeno comes na proporção do tamanho – qual o maior desejo de Portas? Crescer, e só o nariz lhe faz a vontade, como o do Engenheiro Pinóquio, como lhe chamou sempre a direita com inveja do seu talento de direita também.
Não é por acaso que os dois ministérios em que abundam as nomeações são o de Miguel Relvas e o de Assunção Cristas. No primeiro caso percebe-se que é o homem do aparelho no governo, o gestor directo dos interesses partidários na orgânica governativa. Os 65 nomeados até agora, outros virão, serão a rede, o grupo de controlo, a polícia política partidária. No caso de Assunção Cristas o pessoal nomeado garante certamente uma presença CDS suficientemente ampla para impedir que o parceiro de coligação fique proprietário das benesses económicas que cria o largo espectro de acção que é o território da economia pública e as suas fronteiras com as empresas privadas. É nas parcerias público privadas que está a virtude e no trânsito que permitem e sugerem. Neste aspecto a imaginação destes governantes é rigorosamente criativa pelo lado da quantidade possível de nomeações em “sede” de crise da dívida. Com tanta desestruturação dos aparelhos ministeriais em marcha, das suas orgânicas efectivas, este contingente de assessores cria uma espécie de poder paralelo possibilitando uma gestão dos actos de governo muitas vezes à margem das próprias legislações e orgânicas sectoriais. Enquanto o sistema de poderes não estiver garantido e seguro pelo lado do controlo vai ser assim. A tomada do poder é a tomada do poder pela via das fidelidades pagas. É assim.
E a crise? E os desempregados? E o corte na despesa pública? São tudo apenas variáveis da política como engenharia financeira, mesmo nesta crise. Se necessário for despedem-se mais funcionários públicos para contratar assessores, mesmo que com recibo verde. Ser recibo verde justifica até salários mais chorudos, dada a precariedade. Ele há recibos verdes dourados e precários de luxo, não duvidem.


Fernando Mora Ramos

HARRAGAS

Pintura João de Azevedo

No princípio o aroma

O aroma antes
Sangue o silêncio afluente
Nas entrelinhas o corpo húmido
Dedos se espraiam dentro
A mão desfaz-se em ancas e colinas e seios
O olhar retido na magia da carne a deslaçar em nós de silêncio
A noite dentro ardendo de uvas que estalam

De frutos estão os aromas
As uvas a mulher macieiras
Haverá gramáticas um lirismo de cá
Dos frutos os cantos se fizeram
De amores os anos e a ilha

Peixes sem eito refractários a qualquer interior na outra ordem que ordena
A impedir que de palavras
Se fabriquem aromas

Os dedos vadios
O destino no inominável vital
Deslocalizadas na aragem as pedras falam
Fora parece ontem encadeamentos

Inclassificável a porta calada
A cal a preto pão da planície soprado na noite que sobe?

Emílio Navarro Soler

domingo, 28 de agosto de 2011

Caro Xico re-primo sempre,

Manhiça acordou alvoroçada, feitiço? Nada, não foi, foi o que não sabe explicar e isso primo resempre é sempre lixado. Quando não sabes é lixado, ficas a pensar no que será e não será e deitas sortes, assim como contar as pedra que estão perto do sapato ou ver as folhas a cair e pensar que o mundo está falar contigo. Mundo fala, cão fala. Cão ladra porquê? Foi Deus Xico, foi Ele que pôs cão a ladrar. Homem não ladra porquê? Porque seria cão e não pessoa, até mufana sabe isso. Cão fala? Fala, mas ladrado. Cão ouve, isso sabe que cão tem, cão tem ouvido. Dizer ao cão: deita e ele deita. Pessoa diz: deita e pessoa não deita, resmunga, coça piolho, dá a volta ao juízo do mais velho, estou a falar mufanita que deve deitar para ir na tabuada de manhã – com a crise só aprende tabuada de contar a dívida, a dívida dos dois, dos três até à dívida dos dez, aqui tem dívida também, só tem mesmo dívida dentro, a dívida é orgânica, está metida mesmo dentro dos tendões, no músculo, na sola dos pé tal como filária. E hoje nos madrugada houve fenómeno, natureza está dizer coisas e não estou a falar sismo, essa fala grossa, estou a falar de colectivo de cão aluado. E é isso, mundo fala e cão fala para dizer coisas que natureza faz, cão é aviso. E mundo fala outras maneira, à primeira, sem prólogo nem prefácio, com a folha que cai, as pedra no caminho, vento, assobio maior, furacão, fala cheia, fala mar encrespado. Já viu mar encrespado? Aqui na Manhiça não tem. Precisa ir nos costa, lá onde oceano salgado lambe areia, ir no onda do Índico, é verde essa. Onda também fala. Mar encrespado cospe jangada num segundo pela crista da onda – não estou a falar surf estou a falar pesca. Encrespado ouviste no Boletim da Meteorologia. Você ouve boletim? Aqui ouvimos porque planta mandioca. E mandioca não gosta muita água, gasta mínimo, pede pouca, mas tem de ter alguma. Gota a gota? Nada, gota a gota é bom para papaia, manga, mas mau para mandioca. Mandioca requer chuva molha tolos, assim quase cacimba. Cacimba é chuva? Não. Cacimba molha como chuva? Molha. Então como não é chuva? É chuva lenta, chuva pouca, chuva poalha. Primo, houve feitiço, ouvi e ouvido é radar mais que olho. Houve feitiço. Acordou e tinha todos cão a ladrar em orquestra, todos junto, todos no mesmo tom, como aquele violino que vê na televisão quando vai a Maputo, aquela orquestra de branco com sem preto quase que tem muitos instrumento e não é como os marimbeiros de Quissico, os toda timbila, esses só tem marimba, é aquele que tem piano, tem violino, tem aquele instrumento de bunda lateral, anca infinito e que bum bum, baixo mais que baixo, tem sopro, tem cauda de piano, e tem pessoa com raminho de árvore a chicotear simbólico com silvo no ar e todos toca para um lado e depois outro lado e depois todos junto. Ouviste esse fenómeno de cão todo junto, alguma vez? Cão tem timbre vocal? Tem. E cão coral tem timbre? Tem timbre coral? Tem. Nada, tem fenómeno, fenómeno é situação, temos situação. Cão que ladra junto, todo junto, está a falar com os dono humano, está a dizer perigo na cabeça do dono se dono tem. Cão á amigo do homem? Não. Cão é amigo do dono. E sabes primo, desconfio. Desconfio mesmo grande que Ele está fazer marosca. Ele está zangado com bicho homem, é corrupto e castiga pobre que dorme nada nem dorme com a fome perto. Preto faz coisa lixada a preto, como branco nos tempos, pior como pior dos branco. Ele, o Senhor está chateado, está preparar uma das sua e não é sismo nem cheia. Ele anda fodido com bichomem. Creio primo que Ele vai pôr cão no lugar de homem. Vai pôr pessoa a ladrar. Eu sinto que estou quase a ladrar, falo mas parece que ladro, escrevo e ão ão. Vamos ser condenado a ladrar e cão vai tomar lugar de pessoa, vai mesmo dar aula. Cão tem mais juízo. O Senhor falou nas encíclicas: anda coxo e vai, e coxo levanta-se anda coxo, vai dizer: fala cão e vai dizer ladra humano. Mesmo Papa vai ladrar, vai ladrar latim, ladrar erudito, não é Heródoto é erudito. Essas são os novidades primo. Da próxima vou mandar latido via NET.
Abraços primo, daqui da Manhiça, nosso umbigo,

Do teu
Benjamim Saguate Chicuembo

PS - Essas coisa de cão agora até faz lembrar Entrocamento que é lá, lá, lá, lá longe, do lado de lá do mar, naquele terra piquenino que tem rectângulo e idade nos novecentos.

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Posts sábios (II)

Há algo de perturbador nestas manifestações de ricos que entre Nova Iorque e Paris se mobilizam para que lhes aumentem os impostos. É preciso que uma democracia ultrapasse todos os limites da submissão abjecta aos interesses de uma elite para que esta acorde repentinamente de um torpor de três décadas e nos comunique que nos esquecemos de a taxar.

Não competia a Warren Buffet ou à herdeira da L’Oreal propalar a generosidade de quem sofre com as dores do mundo e deseja, sacrificando-se, mitigá-las. Pelo contrário: nós, a opinião pública e o poder político deviamos tornar esta espécie de grandes gestos ridículos e desnecessários. Num país decente, com uma justiça fiscal rudimentar, os multimilionários deviam queixar-se dos seus impostos como se queixa um cidadão normal. Mas para isso era conveniente que os pagassem.

A Europa e a America encheram-se de vassalos desta casta que agora quer ajudar-nos. Que a criadagem das nossas plutocracias preencha os parlamentos e as administrações das empresas públicas distribuindo entre si as sobras das grandes fortunas com mesuras e salamaleques é o mais trágico testemunho do grande equívoco liberal: a ideia de que podemos deixar os grandes em paz enquanto recomendamos frugalidade aos pequenos e distribuimos roupa e comida pelos pobrezinhos.

Só uma sociedade de escravos consegue ser feliz entre esta miséria moral.
ICI

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

O papel da formiga cadáver nas finanças do Ministro Gaspar

Qual o papel da formiga cadáver na crise? A formiga cadáver distingue-se das outras pelo seu porte e mau cheiro. Ela não só é maior mas pode-se dizer que tem bunda. Já se viu formiga com bunda? Temos que dizer, sem peias, que sim. Viu-se, e viu-se em muito carreiro em que a formiga cadáver faz a sua tropa diária dando à bunda com indecorosos meneios de cobra e mentira. Qual a relação da formiga cadáver com a crise? O mau cheiro. A crise cheira mal, abunda de exalações negativas mal cheirosas e tudo isso, sabemo-lo, por experiência própria e empírica de estatuto, também acontece com a formiga cadáver. É um bicho antipático como a crise é e se temos empatia com gala-gala, pelas cores de papagaio que apresenta na tola nervosa e mecânica – gala-gala é bicho de corda certamente - , não temos empatia nenhuma com a formiga cadáver, não conseguimos, como também não simpatizamos com a crise porque a crise nos vai ao bolso, à vida, ao transporte, à reforma da cueca, ao silêncio da casa, ao comer, mesmo à vontade de outros assuntos de corpo e carne, esses que insuflam vida na vida. Crise apouca-nos, brinca connosco como berlindes criatura, joga-nos na maré da história como menos que formigas, faz de nós raspas de gente que vão com a maré que vaza, pedaços de gente que viram pessoa detrito, habitante de um cosmos lixeira, pois que fazer senão comer o comido e repetir o repetido. E isso é só assunto material? Não, é assunto ético, pois a crise é des-ética, boa para uns e asfixia para outros e isso, dizem os donos, é democrático porque é voto e voto é democrático independentemente da verdade. Democrático e verdadeiro tem relação? Não, democracia vive da mentira e verdade da impossibilidade, nada cose. Democracia tem muito espelho e deforma a verdade, verdade tem uma cara mas está escondido, não pode mostrar pois arrisca a vida - as trombas da mentira gostam de esmurrar as caras da verdade porque estas ainda por cima são mais lindas como na história da bruxa e do espelho e são caras talhadas de um golpe de sinceridade, também em desuso.
Aqui na gente, onde pisamos terra, é assim. Mas aqui tem mesmo problema grande, mesmo grande mesmo maior, maior que sociedade dos espelhos que deforma a verdade e faz prosperar a mentira, tem problema de chuva e cereal, tem problema de cheia e de subsistência. E tem quem desvie de matar a fome para fazer da fome negócio, isso sabe-se e isso tem polícia metido, polícia ladrão é mais ladrão que ladrão necessitado. E que tem formiga cadáver com isso? Esse é um conselho que a gente dá daqui deste sul da Boa Esperança: formiga cadáver é petróleo disfarçado de formiga e merece investimento – muita formiga junta faz um lago, pouca formiga junta faz ribeiro, só falta oleoduto e colete à prova de mau cheiro para as narina poder manipular formiga petróleo cadáver.
Há que dizer que aqui temos muito petróleo de formiga e queremos generosamente ofertá-lo porque falamos a mesma língua – literal e metaforicamente - e partilhámos a mesma história, nós com o ferro no pé e os branco dos tempos, e outros negreiros, com o charuto no lábio. Aproveito o Javali estar Sentado para dar essa notícia que é equivalente dos chineses comprarem dívida lusa, isso dá-lhes tusa e tusa chinesa tem fotocópia de triliões segura.
Esse petróleo cheira mal mas é renovável e biológico, formiga cadáver não extingue, não é como carapau, stock eterno como o Senhor D. tem na sua omnipresença e omnisciência e omnioquefor… (reticências de fulgor celestial).
Que fazer? Juntar muitas formiga cadáver, pedir audiência no Gaspar e esborrachar formiga quando ele estiver a roubar o subsídio de natal do pinheirinho simpático, esborrachá-la na careca do Gaspar, na tromba do Gaspar. E mais: meter os exército de formiga cadáver no caminho do IVA e do IRS e da cachimónia do Gaspar, de forma a que o Gaspar – o vosso Gaspar – se ponha na alheta para outras paragens, bancárias off shóricas, tudo a remos braçais pois não merece mais. Esta estratégia da formiga contra a crise é boa pois a única coisa que endireita a vida torta é o Entrudo e formiga cadáver é bomba de mau cheiro com utilidade táctica por causa da estratégia que temos de mais horizonte para o povo que este não chega, está curto.

Xico Nem Saguate – de Maputo Xilunguíne com CC para o primo Benjamim da Manhiça

Esse artigo está escrito de acordo com o desacordo ortográfico, sempre sempre ao lado dos CÊS

Posts sábios

"Na Líbia caíu outra ditadura. Vejo as imagens dos rebeldes a disparar metralhadoras e não me comovo. Não sinto nenhuma simpatia pelos rebeldes. Falo com algumas pessoas que evitam o tema (ou me evitam a mim?). O presidente das Nações Unidas pede aos rebeldes que sejam clementes. Logicamente deveria pedir à NATO que, para evitar massacres, começasse a bombardear os rebeldes. "

terça-feira, 23 de agosto de 2011

A luta de classes já não é o que era (II)

Reforçando a minha tese de que o mundo está a ficar muito confuso e nós com ele, o pessoal do Blasfémias desatou a bater nos filthy rich.

Do lado da montanha ninguém chora

Pintura João de Azevedo

A luta de classes já não é o que era

Depois de Warren E. Buffett, considerado o terceiro homem mais rico do mundo (alguém tem o seu número de telefone?), ter vindo afirmar que devia, ele próprio, pagar mais impostos, foi a vez de um grupo de multimilionários franceses disponibilizar-se para ajudar a combater a crise.
Em Portugal, sempre na vanguarda, Belmiro de Azevedo defendeu, já o ano passado, soluções muito menos reformistas, chegando mesmo a lembrar que quando o povo tem fome, tem direito a roubar.
Uma frase que confirma que os nossos capitalistas são muito mais à esquerda.

Estou melhor — obrigada por terem perguntado

Retrouvée ICI

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Carapau de escabeche tem horizonte dentro?

Pensamento único é como lobotomia olho metido na venda não vês nada só aquilo que te dão ração mental nem o resto nas borda daquilo nada só aquilo é como cegueira só vês o excesso do que luz em show o mesmo prato somente pensamento único é como carapau catorze anos carapau durou a guerra uma adolescência inteira a carapau aí quando surge outra forma tu chamas carapau chamas carapau ao peixe serra mesmo ao tintureiro martelo só conheces carapau globalização abre a porta do múltiplo? Tem tanto múltiplo disfarçado que afinal ficas no múltiplo moído no mesmo a porta do autêntico fica cerrada só o mesmo e seus disfarce plástico de proveta a enganar a fome
Globalização é escravatura é off shores dos mesmos é paraíso fiscal paraíso alguma vez foi fiscal? Só mente mesquinha inventa paraíso fiscal paraíso tem pássaro e ninfa não tem banco banco é bicho de paraíso ou arara alguma vez banco é acumulação é o teu gerido por outros para outros tem arara no banco? paraíso fiscal é mesmo falta mesmo mesmo falta de imaginação é imaginação fiscal é imaginação banqueira coisa imagina banqueiro? Imagina dinheiro imagina o mesmo imagina lucro imagina taxa paraíso tem a ver com essa imaginação? Não
Paraíso vem na escritura e na escritura não vem banqueiro vem Adão vem Eva vem cobra vem macieira vem off shore? Não nada pensamento único disfarça de múltiplo pensamento único é pensamento do lucro da camarilha do negócio obscuro de Estado que vira privado pensamento único é encher bolso privado com dinheiro público negócio é paraíso? Não negócio é dinheiro dinheiro compra paraíso? Compra imitação de paraíso compra teta de silicone compra violência lado de lá do muro compra prisão de luxo isso é paraíso? Não paraíso é sombra fora do mapa é mapa fora do mapa é outra vida como era quando inventou a vida é outra vida como se pode plantar de novo pode plantar paraíso pode como? Com racionalidade de espécie humana livre onde isso está? Não está é isso que é de inventar inventar é isso pôr na realidade o que não há é isso paraíso? É paraíso por vir
E que tem carapau com isso? Essa história de carapau é a cidade sitiada em que só comia carapau africano pescado em barco russo para alimentação do povo sitiado
O planeta também sitiado refém do bicho especulador e dos governo que lhe serve caninamente planeta sitiado por condomínio off shore esses sim são extraterrestre não que sentem nem como cão são infecção do seu casulo condómino ordenam no planeta têm bunker têm avião para a lua têm latifúndio em Marte têm cidade subterrânea
Famintos do mundo das secas tesos do planeta per capitas de nem um dólar dia favelas do mundo becos do mundo guetos do mundo precários do mundo indignados do mundo mundos do mundo mais que as bordas repletas do Ganges os longes desconhecidos da China o interior das Ibéria os planaltos da Angónia somos todos os nordeste todos os do sul todos os que atravessam mundos todos os barcos repletos de náufragos juntem-se em humores afluentes

Benjamim Saguate Chicuembo

Herança colonial


A limpar o monumento. Belém

Foto JOTA ESSE ERRE

domingo, 21 de agosto de 2011

No tempo do Comandante Nino o Pingo Doce não era assim

D.O. ultrapassou todos os limites aceitáveis entre pessoas de bem, pelo que o Tribunal será, como deve ser em democracia, a instância adequada para apreciar este assunto
Pedro Soares dos Santos, em resposta a Daniel Oliveira.


Via Jugular

Caro Benjamim meu primo direito resempre sempre

Tens razão bicho ficou escasso ficou como calça com bainha no joelho calça comprido vira calção curto paulito ficou curto atiras o pau e só tem metade do caminho é feitiço parece que tem parede invisível a parar a nossa vida calça ficou assim parece moda tem calça com falta dela e é moda aqui não é não é mesmo falta de calça encolheu meu como encolhe a barriga como prato meio prato como colher meia dose assim pouco o meio agora é o todo: a metade estás a ver dantes tinha um inteiro que era todo agora a metade faz de todo mesmo pessoa nalguns poiso está minguar pessoa fica anão não mas fica como faca fica uma fatia pessoa fatia assim como zinco que é fatia dura mas fininho
aqui neste Xilunguíne já nem fala ronga nada nem changane e Araújo Road tem light’s viradas para teta silicone cumpre magreza com acrescento de borracha finge carne borracha não apalpas não é borracha lembras da escola lembras que é para apagar lápis aproveitas papel sempre no mesmo folha fazes muitas tabuadas fazes aritméticas até ao fim do folha mesmo fim no fim ainda escreves numero piquinino
muito diferente de Manhiça mas bicho perigoso é o mesmo é bicho poder esse bicho não pára no semáforo vermelho com medo de bicho mabandido? Não bicho poder tem guarda tem caçadeira cano cerrado
não pára porque vermelho é cor de parar os que não tem poder os que tem poder não tem cor de parar anda sempre no frente e faz todo o terreno quatro por quatro mesmo no alcatrão liso quatro por quatro dá estadão é importância nas quatro rodas e tem aura de poder
poder dá espectáculo de poder exibes poder é pavão não pavão não abre em leque
aí não tem bicho mas tem mato e mato é sempre regenerativo é como ferida tens ferida e ferida vai no cicatriz e cicatriz vai no seco e cicatriz que vai no seco solta-se e fica umas marca na pele que depois desvanece e ferida passa a memória
elefante volta elefante é mais velho que guerra civil pode chegar no centenário elefante tem memória de elefante e tem trilho na lembrança sabe elefante volta hipopótamo não hipopótamo é mais territorial é como cão mija à volta e é propriedade como primeira senhora é propriedade que não tem e faz sua mesmo praia do povo dantes que passavas na duna para a praia agora tem duna privada nunca visto nem nos tempos mas eu vi mesmo vi lá no Bilene mesmo tem duna tem dono
elefante não mija à volta elefante viaja e agora viaja de volta tem lembrança do trilho e volta do Malawi elefante anda milhares até voltar na sua árvore predilecta na sua charco na sua planície elefante nasce num sítio mas partilha
talvez aí na Manhiça gala-gala volte para educar as criança educação sem gala-gala fica coxo gala-gala era nosso dinossauro e explicava os tempos não os tempos de como dizemos nos tempos mas os tempos mesmo aqueles que estão lá mesmo lá mesmo na pré história gala-gala vinha dessa pré história e era gala-gala verdadeiro não tem corda nem pilha era mesmo carne e osso não tem de plástico como não tem brinquedo que não faz nós faz brinquedo aproveitas lata aproveitas cartão aproveitas madeira aproveitas tampinha de refrigerante aproveitas pneu aproveitas cordel sisal serapilheira pano bocado de lápis pedra terra folha galho cola resto de móvel resto de osso espinha seca olho de boneca de plástico para prótese em boneco de lata sem norma EU criança mesmo criança pode cortar dedo na lata e aprende tem vacina tem criança apartamento fica mole só sabe de almofada
aproveitas o que tens à mão essa política é que tem não tem outra investes nos dedos tocas no piano das coisas que te calham assim tocas e fazes milagre sai som mesmo como sai da marimba som que aconchega na cabaça dá avolta na cabaça a volta e depois é cuspido pela pele de árvore e rosna assim desengonçado nada high tech que precisa high tech para quê? Precisa inventar sim
primo direito meu resempre
melhor ter esperança desesperança não adianta desesperança atrasa: é como dente que não tem não morde e dá cabo do peito
peito não aguenta chama-se hipertensão tensão lê bem batimento no metrónomo dos enfermeiro aí bates mais do que podes e descompassas ou aceleras a estrutura mesmo estrutura não é funcionário é genética orgânica do órgão cardíaco somos animais cardíaco e isso custa poder é animal réptil tem sangue frio no poder não custa é outro tipo de bicho réptil faz emboscada tem emprego de emboscada desde novo tem família inteira de fazer emboscada e tirar aos pobre para dar a si mesmo rico só pensa no si mesmo
aí na Manhiça vão vir melhores dias vai chover mais vai vir milho primo vai vir bicho bom vai vir nova infância não tem escolha primo só tem uma vida primo e agora a dolorosa primo: não tem para emprestar gastei tudo primo gastei o nada que tinha primo só tenho braço primo mas eu sei primo que vai vir bom tempo mesmo tempo de bicho humano que este não parece este é tempo de bicho ruim tem malária é malária dos de cima que manda nos de baixo para ficar sempre em baixo lá onde não tem de que viver

Xico Nem Saguate

CROCODILO GARROTADO

Pintura João de Azevedo

sábado, 20 de agosto de 2011

Papa e indignados

No princípio era o verbo. Era o verbo no meio e no fim será o verbo. O sopro divino era o verbo a corporizar-se criação, objecto, natureza, humanidade, feito como os operários vidreiros fazem, mas sem divinização alguma, quando inventam com o vidro formas de uma transparência divina.
Entretanto o corpo é que paga, como diz a canção coxa numa verdade insofismável. Paga sempre e paga de muitas maneiras, paga levando com o bastão da polícia e paga até impedindo que as palavras se formem inteligência nessa parte do corpo que se chama cérebro, centro nervoso, comando, motor, o nosso Cockpit, como diria um tecnocrata imaginativo assessor de um Passos.
O Papa tem o corpo resguardado e à prova de qualquer pecado, menos do luxo: o luxo dos sapatos Prada, o luxo dos paramentos, o luxo dos dourados, do arsenal de acessórios de uma visão que sendo medieval joga a fundo no pós moderno, experimentalismo em voga de todas as regressões, ou não será isso a sociedade do espectáculo?
Da missa restrita à missa global há que organizar o espectáculo, o papamóvel, os directos globais, as cantilenas da massa e fundamentalmente essa possibilidade de sem paredes termos por céu o céu real, ritual máximo de uma presentificação sacralizada em que a referência e a coisa referida coincidem - e o Senhor mora naquela sua Casa, ali à vista, ficção como tudo o que é objecto de fé e a teologia historia -, como aliás o Papa coincide também com a função delegada que tem do divino e ali está ele, corpo lento e velho, corpo simbólico tropeçando na idade, gestos pausados, o verbo mais que lento, à beira da imobilidade. Nestas coisas do espectáculo do divino só há tranquilidade, a fé vive-se no exterior do stress, o stress é psicologia barata do quotidiano e a fé inscreve-se na crença da eternidade, essa qualidade que a matéria partilha com o que os crentes interiorizam e que se vê no ritmo do Papa: o Papa fala no ritmo da eternidade e tudo o que urge não apressa ritual algum, os que morrem, mesmo em violências evitáveis, partem por vontade do Senhor. E quem não aprecia a lengalenga lenta dos cumprimentos em todas as línguas, infindável selo de garantia da presença da Igreja numa geografia multi-continental? É um espectáculo tragicómico insubstituível, a não perder, a que só o génio de um Tótó daria sublime e inultrapassável expressão de farsa hiper-realista, filme a imaginar.
E toda esta empresa em Espanha, com os jovens do Papa a cantar que são dele, custa de facto fortunas ao erário público e acrescenta dívida à sua tragédia de misérias diária – a dívida é o corpo do diabo agindo, disso não há dúvida, nem figas a fazer de antídoto protector e no entanto o papa não o desafia abertamente.
Contas há que fazer apenas aos salários, para os cortar, aos direitos adquiridos, para os diminuir, aos custos sociais para os fazer minguar, à saúde para se tornar gratuita para o Estado e despesa para os cidadãos, mesmo para os crentes que apesar dos milagres – e este papa sendo mais teórico é mais pelos milagres, mais amigo das trevas – têm essa contradição de ir aos médicos, aos hospitais e de desprezar o que é parceiro do milagre, a mezinha e a oração corta-febre, corta-doença.
Mas não há por certo contas nenhumas a fazer a uma operação deste tipo pelo lado da despesa do Estado. O Estado laico paga a Igreja dominante e para a Igreja dominante é mais confortável assim, beneficia há muito de direitos adquiridos pactuados, particularmente fiscais, indiscutíveis parece. O Estado laico nunca o levou até ao fim, o projecto laico.
Creio que os indignados se indignam com este estado de coisas, são como Cristo que se rebelava contra as injustiças e pugnava pela igualdade contra os soberbos. Os indignados estão contra este Papa pois sabem que este Papa trabalha para que os ricos entrem no Reino dos Céus, são eles que são os seus sponseurs e lhe pagam os Prada. A história do camelo a passar pelo buraco da agulha é improvável na boca de Ratzinger, apesar da beleza da metáfora - pondo de fora as bossas, claro.
O céu é mesmo o Reino dos que têm e têm muito. Este Papa é muita despesa, tem a vocação do despesismo, ele é pelo luxo cerimonial.
Poderia o Vaticano comprar títulos da dívida, como a China? As suas reservas de ouro são ilimitadas dizem e o património vastíssimo. Agora que os pobres são cada vez mais era altura da Igreja se preocupar com a economia de modo prático e não apenas em palavras?
Mas Sua Eminência falou com Zapatero de questões económicas e os resultados certamente não se farão esperar, mesmo que o domínio do senhor não seja o mundo secular.
Os pobres sofrem Senhor e a Igreja dá-lhes o quê, espectáculo?

fernando mora ramos

Movimento dos Indignados (6)



Barcelona

Foto Margarida Araújo

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Há caracóis

Bitoque
Bitoque com ovo a galope
Bitoque a cavalo no ovo a trote
Bitoque sem modernices
Bitoque sem ovo caseiro
Bitoque em arena com batatas fritas à casa
Bitoque com batatas fritas ovo a cavalo e jardim de pickles
Bitoque em prato cerâmico com pão à vista
Bitoque sem pão à vista para dois em travessa
Bitoque grelhado aliás sem molho conforme a massa corporal do cliente
Bitoque grelhado com ovo frito em banha Light e soja
Bitoque simplesmente como maria
B.
I.
e
Toque
[Há polegares servidos sem impressão digital incorporada, os outros não são comerciáveis]
Que bitoque e quem bitoque
Diz-me que bitocas dir-te-ei quem és

Emílo Navarro Soler (do livro no prelo silly season’lirics)

Movimento dos Indignados (5)



Barcalona

Foto Margarida Araújo

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Peixe tem ciúme

Peixe tem ciúme tem guelra peixe tem espinha quem que duvida peixe é muito tamanho diferente e se tem ciúme tem ciúme de tamanho diferente ciúme grande e ciúme que engole ciuminho
peixe tamanho elefante assim também comprido como piton ou cilindro tem peixe cilindro peixe cilindro tem ciúme que cilindra peixe ciúme morde? Não
nunca vi peixe ciúme não tenho cana apropriada nem isco nem anzol para peixe ciúme sou pezinho de coentrada pezinho dança sem ciúme só pontapé disléxico nem que intencionado
peixe porco sim sei de peixe porco sei que tem peixe porco tem ciúme porque é omnívoro e omnívoro tem tudo para comer tudo e come ciúme quando comes ciúme adquires
não é porco peixe porco peixe porco não tem febra tem escama já viu porco com escama tem? não tem só tem peixe porco quem diz peixe diz bexiga natatória diz guelra diz o quê diz peixe
peixe tem sua vida dentro de água dentre de água tem ciúme na alga tem muito mundo tem coral tem rocha tem tubarão não tem carneiro tem balança não tem não tem horóscopo tem sal tem vida sal flor de vida
tem baleia sim baleia tem ciúme tem sim baleia é mamífero tem ciúme mamífero mama tem ciúme ciúme é coisa de teta vem na teta então ciúme é leite
ciúme complicado é ciúme de baleia porque é muito ciúme é ciúme grande esse tem tsunami é ciúme maremoto

BENJAMIM SAGUATE

Movimento dos Indignados (4)



Barcelona

Foto Margarida Araújo

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Uma canganhiça lixada

Fizeram-me canganhiça o meu pé não pousa minha perna não anda
meu olho vê para dentro mas não nada para fora está quieto de paisagens que não fixa
foi espírito malvado uma canganhiça dos antigos
vais no mato estás a pisar o capim pensas que é cobra nada é canganhiça
foi mesmo feio de chicuembo falso entre duas pedras e cabeça de macaco desorbitado quando tens cabeça de macaco desorbitado tens poder só assembleia de espírito
nem com dúzia de pescoço de galinha não apaziguas nem resolves com raiz de capim alto nada aí tens mesmo de parar e fazer dança ritual
despejas duas garrafas do uísque na base do poilão poilão grande despejas quatro aí talvez mas mais as galinha claro as galinha guardas pescoço pescoço de galinha apazigua cabeça de macaco desorbitado
foi meu falecido pai que ensinou ensinou com abecedário meu pai sabia de feitiço
fazia feitiço de pedagogia com pedras sete pedras
não posso receitar ainda que não tive revelação nocturna nem árvore nem vento que me falou no ouvido interno nada nem no subconsciente que fica depois do ouvido interno
para dar receita não estou autorizado
quem me ajuda a desenfeitiçar olho e perna
tem curandeiro no facebook?

Benjamim Saguate

Movimento dos Indignados (3)



Barcelona

Foto Margarida Araújo

terça-feira, 16 de agosto de 2011

A antropofagia que nos une

Janelas em odores calados e estáticos
A amálgama dos dias no fio
Os dedos como menires
E o tempo da erosão anunciando
Novos paradigmas de carne enrugada

Azuis passeiam-se
Lentos nas encostas das dunas e parágrafos
As dunas são lentas
E movem-se ou são rápidas e movem-se
Mais rápidas que o amor
As dunas enraízam-se no léxico

O tempo que isso leva a ver não está já na nossa disponibilidade
E elas trabalham em horário completo
Descem pela noite e de dia queimam
Sobem pelos dias e de noite formam-se novas
Por isso queimamos o tempo em cigarros de dedos

Não temos o dom das dunas
Relógios de instante nervoso
Tempo pequenino psicológico
Os pulmões explodem de cinzento que não preenche
Estamos então na porta da velocidade
A cumprir o programa quotidiano

Passam lentas as catraias na rede embaciada do olhar
Lentas de decifrar e rápidas a sorrir
E as dunas são milenares
Antes o mar depois o fogo
E as palavras são muito depois do magma

O magma e a cinza
São o mesmo corpo
A cinza corpo de dunas
Escreve na sua imensa face antracite
Pela pedra abaixo até à rebentação de espumas incessante

Milenar e extensa encosta como não somos a sua medida
Nem essa coisa da metáfora
Cabe na encosta negra
Foi na leva do fogo escorrendo

O canibalismo de lírico tinha a escuta
A sintaxe elementar era basicamente canina
Apenas o corpo e a sua sageza rafeira
A azagaia mais tarde
Corre o tempo contra o vento ao encontro do corpo

O tempo era o faro antes do tempo
O tempo animal
O silêncio a ameaça
Mais tarde o vocabulário fez da duna metáfora
Muito mais tarde

Os olhos deixaram as unhas e passaram de ver a ser vistos
Os pássaros entraram nas rimas
E muito mais tarde os motores e o carvão a mina
Fogo incandescente a cavar a rocha
A mina e a pedra na pedra

Na pedra as vidas foram a pique
Para o calado negro da noite ardendo
Fogos de fornos crematórios depois
No tempo do canibalismo pior que elementar
Queimadas de corpos ardendo em pira e valas

Tudo isso enquanto a duna se manteve mutante
Depois da carnificina
A carnificina doce
Depois do amor as suas descartáveis formas
Como o voo rápido do pássaro que se sonha

No tempo das fábricas
As palavras em espinhos
No tempo entretido do espectáculo
Morremos soterrados de imagens

Essa coisa de mortos vivos
É extraordinária poesia de Beckett
Imóveis a repetir os gestos
Enquanto as dunas se movem
Longe da vista
Na batida do cosmos

O seu coração
É algures
Entre o princípio e a primeira explosão
No centro do magma
A vida resiste a temperaturas inexcedíveis

Dizem essa coisa extraordinária
Que é vir do nada
A duna desce a duna desce na duna
O tempo do cigarro azula
O silêncio dos dedos prescreve
E as fábricas são novas Cretas de vasos cuneiformes
Nos vasos as ancas pelo silêncio do traço subindo lentas
As miúdas da última psicose do corpo abstraídas da pose

Quando o titânio recente for absolutamente derrotado e
Não pertencer a nenhuma liga
Entramos definitivamente na nova galáxia de medos
E o governo das almas será uma gestão dos medos
Os medos plantados do medo

Entretanto a maçã também azula
É essa coisa da imagem
A devorar-nos como uma maré
Que entra segura pela cabeça dentro

O mar
Esse
Estará de novo
Em formação de novos continentes
O vocabulário será amplamente mutável e inscrever-se-á
Nas cabeças como rubis e pérolas
Essas novas minas humanas
Serão muito procuradas
Pelos caçadores de novas sintaxes

Emílio Navarro Soler

Movimento dos Indignados (2)



Barcelona

Foto Margarida Araújo

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Caro Xico Saguate meu primo direito sempre

Escrevo-te sobre o bicho bigode lambe que trouxe infelicidade
O bicho como era não sai do mato só cobra sai mamba preta que cospe tira a vida o bicho bicho que vinha na estrada caravana a passar já não tem não vês onde se meteu comeram nos tempos ias na estrada e vinham os bicho eu que me recordo a passar o grande Save na carga sobre o oleado a cacimba nos joelhos a estrela no tecto abóbada de cima assim placenta de cor sem fim com filho estrela pendurado até outra galáxia tinha galáxia de madrugada quando tudo está calado menos cobra raspa que raspa na areia e bicho nos tempos corria na picada livre como bicho livre como natureza eram os tempos do bicho gala-gala também esses
o bicho reformou esse javali ouriço gazela macaco cudo reformou a natureza reforma também velhece corpo e bicho que aparece tem dente branco mesmo branco brilhante que marfim polido de branco olho de ratazana mãos de mabandido come metical nem sal com à primeira de olho fechado e ventre pronunciado ventre dobra o cabo do umbigo ventre gordo é prestígio a gente sabe que é assim magro aqui no capim nacional não tem beleza a gente sabe gordura não é formosura é poder escreveu a LENINA em abril nas sete teses se eram sete tudo que tem sete é verdade mesmo as saia da nazarena da catembe e poder da gordura é formosura gordura come magreza é luta de classe cabrito come onde tá marrado cabrito come papel cabrito come tudo cabrito parece bicho do metical tem bicho do papel sabia bicho de biblioteca sabia bicho come livro come letra comer palavra come parágrafo algum só come pontuação é caviar para bicho de papel há bicho especializado em reticência sabia bicho mais que fodido acabou com a biblioteca nacional de uma país que não tem nacional nada mascou fio de electricidade já nem papel curtocircuitou tudo comeu interruptor
qual o cu qual é ele que é bonito e não desvaloriza: o cu grande meu
grande é bonita uma verdade
cu magro cu magro nem dá para cantar
esse bicho de novo tipo vende influência que é uma nova espécie hortícola se tens influência tens conta bancário e progrides
hipopótamo já nem InKomáti vê nem nada andava ali aquela bocarra de agarrar o mundo nas mandíbulas nada e lembro mesmo desse até vi dos miradouro só com olho bom da infância lá nas curvas mais apertadas esquecidas lá onde o longe não tem pé que o alcance nas paisagem da memória
bife escasseia andamos precários mandioca sofreu ataques de rato de rato mesmo e de rato regime mesmo tempo anda mal e mesmo nem gota a gota conheces gota a gota é invenção da seca gota a gota de lágrima não cresce mandioca só ruga rego ribeiro menino de desespero conheces e nem suruma ajuda nada já nem dá tesão de sonhar como dantes
aqui na Manhiça estamos fodido e o velho que deu o cabrito à primeira dama agora não come está fodido estamos fodido colectivamente não sei primo se me podes abonar umas tenças nem que seja poucas UMAS ASSIM MESMO POUCOCHINHAS COMO TROCO ESQUECIDIO NA FÓRMICA DA MESA ANTIGA DO CAFÉ DA ESTRADA única aquele mesmo do senhor simão pequeno que gaguejava umas letras em ronga
a estrada vai bem foi chinês ou italiano ou não sei e braço nosso braço com currículo de pedra e alcatrão alcatrão e sol areia que deitava fumo alcatrão que ferve calor maior que alguma vez sol inventou nada nem cacimbava ajuda não tem cacimba cacimbo era bom orvalhava nas folha e raiz sugava cacimba como bicho também está a esgotar não tem nem stock como bicho dos tempos não tem stock só tem stock no kruger
estás a ver esse destino primo aqui na Manhiça piorou destino de ver passar a vida ver passar o carro vai no carro vai no mundo vai Bilene vai Xai Xai vai chongoene quissico zavala závora tofo vai para vais no norte do planeta crise tudo como antigamente mas pior quem explica isso primo quem explica ninguém explica Chongoene lembra Chongoene pois nem um daqueles peixinho piquinino dos tempos daquele arco-íris com guelra que cirandava na água não tem primo nem nada
nem que já saímos do quintal os pés incha a estrada já fica longe quando as perna anda menos a perna já não tens os metro que tinha os km que tinha na perna foi-se e se tens reforma nem que é Saguate de pedinte na paragem do machimbombo não chega ainda tentei amendoim negócio de amendoim que outro chama alcagoita esse preto que tem na amareleja conservado em tinto e até que fiz um colectivo de mamana com bacia de plástico vivo vermelho com amendoim até à borda para aproveitas a janela de oportunidade quando machimbombo pára na estrada para meter transportado e mendoim mendoim tudo cantado como no mercado e nada ninguém compra e até quesse markteing nem que era mau alguidar sobressaía mais que a mil metro vermelho mesmo maningue
machimba mesmo de vida machimba mesmo
e se plantas vais preso que fazes? Mandioca nada amendoim difícil rato só chinês
quando descolonizou ninguém explicou que come rato come carapau nada milho mirrou que fazes nem nescafé nada nem leite condensado nada não comes alguidar pois não e na manhiça não tem grilos já ninguém canta só cocoana canta canta suruma com os olhos nas primícia da galinha sacrifício sim que o meu pai morto está a ver-me está a ver se sou pessoa ou rato
cocoana não desiste da bengala sempre coxo atrás da miséria farrapado tem menos tecido que carne que não tem
Manhiça há-de acordar Manhiça teme espírito antigo e raiz grande de gente séria
Manhiça é um mato progressista na beira da estrada sabe que tem estrada e dá para partir dá para chegar não primo manda saguate ao primo saguate para investir mandas
a coisa aqui está preta

do teu primo sempre sempre
Saguate, Benjamim

Movimento dos Indignados (1)



Barcelona

Foto Margarida Araújo

Santo Santana

Não será, numa inversão elementar, como uma freira à frente de um bordel? À primeira parece estranho, mas não houve Sporting para trás e não deu o corpo performativo a Primeiro-ministro, uns escassos meses? Não durou, sabemos, já que o género “andar por aí” não estabiliza e os sérios do capitalismo não querem, nunca, um imprevisível ao comando da nação que especula, criativo demais como o pensamento luso quotidiano mais desbocado.
Já não estranhamos a criatividade institucional, desde Sócrates que é aliás obrigatória, decretada, escolarizada como o inglês técnico, e conta com o que na dimensão massiva é a chama comunicativa imparável, dinâmica de consumo constante de casos como ondas de marés várias, enovelados narrativos de circo básico engodando o apetite da populaça pelo escândalo aliados a grandes piqueniques partidários preenchidos pela excelência de um programa pimba que, diga-se, não será da “estética” do artista convidado e da sua palavra subtilmente grossa, mas do gosto do “programador” que cumpre a política rasteira ao serviço do nível estatístico satisfatório – tirado como quem tira a febre a um corpo sempre à beira dela - do aplauso acéfalo induzido. É necessário manter o povo no medo e na unanimidade burra.
Desde que a oferta perdeu o tino multiplicando-se os pães pelas infinitas variedades a partir da mesma farinha, seja o que for é possível, não só por via da imitação chinesa, mas por superior criatividade lusa delirante, inexcedível como neste caso e renovável em banhos de tinto e branco – em boa verdade, para alimentar a novela e desde que nos jardins de Berlusconi na Sardenha se viu que se passeava, ilustre fauno entre ninfas erotizadas, um ministro checo de pau feito (valha-nos isso) mostra-se logo a casa, já nem a lingerie caindo vale pelo que se segue e tira-se partido do arrojo que é expor a intimidade desnuda aos sedentos voyeurs anónimos. Desde que não se exponham os circuitos do fluxo financeiro subterrâneo, vale tudo, aí o perigo é a voracidade invejosa e descabelada dos terceiros massivos e rios de dólares roubados legalmente podem dar até motim, como em Londres, motim do povo que sub-consome.
A profusão de possibilidades humanas perfilada para cargos institucionais só atesta que não há perfis pensados, ou melhor, que o perfil é a proximidade e as qualificações curriculares e operacionais para nada contam, tanto fazendo ter um construtor civil num laboratório científico como um matemático a falar das vantagens do esparguete se o tema for a tragédia da obesidade em meio escolar aliada à necessidade da dieta garantida por outsourcing a oferecer a empresa amiga. É o caso aqui talvez, mais um caso Santana, e é qualquer coisa que está do lado do êxito que a confusão garante assente na rápida a decisão impensada – importa a decisão apenas. Hoje a virtude está na velocidade e com telemóveis e internet surfamos sempre à frente da sombra, performance que deixou de ser paradoxo de talento pistoleiro.
Mas não será erro nosso esta perspectiva? E não será indicado que uma freira possa gerir um bordel? Com todas as questões de humanidade implícitas pelo lado dramático apensas, mais as de saúde e doença, mais as especificamente de fé, não seria estranho. Ou seria? Para a freira digo. É que o Dr. Pedro Santana Lopes que também foi Secretário de Estado da Cultura e se sentava no Conselho de Ministros, é certamente uma pessoa misericordiosa e tem uma costela de Madre Teresa – grande gestora – desconhecida, mas que é estruturante de todo o seu ser. E não se sabe porquê, andando ele por aí, tinham que lhe arranjar um cargo, um papel, um lugar de relevo – ELE estava disponível, o Sporting está desta vez no bom caminho e ser o vereador líder da oposição em Lisboa é coisa pouca para tanta capacidade múltipla.
Depois da Europa recusada - segundo se diz e apenas repito aqui – talvez porque já não seja assim tão jovem e há uma idade para isso e depois, mais tarde, há outra de novo, nada melhor que a Santa Casa. Que dirá o Patriarca? As Misericórdias são um universo desconhecido e até um pouco opaco, estranhos lugares onde há dinheiro e poderes instalados há muito. E têm qualquer coisa de Casa Pia – não falo de pedofilia, falo de hierarquia, de modelo organizativo, de pré modernidade misturada com avançada tecnologia, claro. É um mundo que a democracia, em extinção, não chegou a conhecer. Talvez o Dr. Pedro Santana Lopes, vindo-se a confirmar este seu destino, venha a ser o autor da sua passagem à modernidade aberta e até escancarada e isso fazia falta, pois Misericórdias não são espaços de intimidade como os jardins de Berlusconi, são espaços públicos e devem mostrar os interiores, são também nossos. Pois não haja dúvida quanto à relevância do caso: com a produção de pobres em aumento exponencial garantida como meta deste governo, as Misericórdias necessitam mesmo de alargar, misericordiosamente, as suas tarefas diárias, e criar mesmo um serviço 112 alimentar para moribundos. Ninguém mais apto que Santana Lopes para uma nova dinâmica, mesmo um novo e nervoso galope de solidariedades ágeis praticadas com fé.

fernando mora ramos

domingo, 14 de agosto de 2011



Avô Crocodilo de Dili

Pintura João de Azevedo

Capital europeia da cultura

Com a Europa a desandar o que será realizar uma Capital Europeia? Fica a estranha sensação de que se de um lado a crise estala e tudo pára aterrado, e reflui conscientemente por tomadas de posição ou falta delas, do outro as rotinas são imparáveis alimentando a Europa de ficção que não virá. No caso e depois de notícias sucessivas – as únicas – sobre as bagunças da iniciativa, centrada em secundaríssimas questões, salários luxuosos e acusações de desligamento da cidade que é seu objecto e supomos nós, também sujeito de projecto, as coisas marcham de novo para um resultado que, com nada esclarecido mais do que um fait divers de uma senhora e do seu alegado mau feitio, não se desenha significativamente nem Europeu nem cultural. O nível de entendimentos corporativos e de protagonismos salariais e outros, mesmo eventualmente artísticos – e que será isso no meio de tanta “indústria criativa”, chavão de êxito mediático pré garantido -, geridos à boa maneira confusa nacional e local, com o ex Presidente Sampaio a ir a reuniões assim a modos de Pedagogo e Padrinho, só mostram que o que está por vir é, culturalmente, irrelevante e que o que não se vê, e se mexe, é certamente negocial, assuntos de verba à vista e de verba menos visível – o nível de detalhe com que se falou do que a senhora iria receber de indemnização brada aos céus e cheirou de tal maneira a coisa montada que mostra como quem manobra julga os outros estúpidos. E a senhora foi bode expiatório, número de futebol conhecido como chicotada psicológica e que consiste em pôr o treinador na rua.
Nestas coisas mandam empresas, grupos económicos – foi assim na Porto 2001 – e poderes locais num grau de equilíbrio que faz tender as coisas para um quadro de decisão que, consensual, não leva a nenhuma mudança, antes sim a contentar facções e interesses instalados – em O Futuro e os seus inimigos, Daniel Innerarity fala-nos bem da irrelevância do tipo de decisão apelidada de incrementalista - mudar para um acentuar do mesmo que estava antes da anunciada mudança -, e também de um outro tipo de decisão assente numa “certa racionalidade da improvisação ou de atitudes como as da espera por melhor oportunidade.” E acrescenta: “ A improvisação é um tipo de comportamento que avança sem planos, sem cálculos, sem determinação de objectivos e selecção de meios, sem a ponderação das eventuais consequências secundárias. O que caracteriza esta forma de decisão é que para os actores do que se trata é apenas de manter-se no jogo, coisa em que muitas vezes consiste o combate político – embora os seus representantes declarem e encenem decisões soberanas.”
Há muito que o projecto devia ter anunciado publicamente os seus grandes objectivos estruturantes – que Capital será o futuro e de que Europa se trata? – e ter posto do seu lado não a cidade, mas o país e certamente a tal Europa de que será uma capital mesmo que efémera. Do efémero nasce o mais permanente - assim é o teatro grego até hoje - o mais sustentável e aqui, entre nós, certamente que uma capital terá como objectivo central a criação de condições de sustentabilidade de uma vida nova, europeia, face à vida velha, não europeia e essa vida será cultural não como oferta, isso é apenas uma questão de compra, mas como criação capaz de se expandir em estruturações novas, o que é da ordem da mudança do mundo, da invenção. Todos os seres pensantes, incluindo os chamados opinian makers – pagos para para formar opinião ao serviço de objectivos ideológicos mais do que fazer pensar – afirmam que a Europa é uma mistificação, não basta a união monetária e a burocracia de Bruxelas mais o Parlamento, centros de interesses hegemonizados pela Alemanha e por uns arremedos de importância franceses. Isso não faz a Europa, essas organizações representam um nível de compromisso histórico hegemonizado pelo poder real da Alemanha que, no momento, age segundo interesses nacionais, a começar pelos interesses dos seus bancos. A Europa patina, bloqueou. O que a crise pôs à vista é: não há Europa sem um nível político de integração aprofundado, orgânica europeia de governo aprofundada, para não falar de um nível cultural de integração que suponha fenómenos institucionais e mesmo orgânicas de criação cultural europeias, um “multiculturalismo” também específico entre as identidades europeias envolvidas no projecto europeu, a começar pelas matrizes.
Enfim, umas animações haverá, uns repuxos encaracolados de luz a três D e outras manobras com muita tecnologia circense mais logótipos em barda, efervescências de espumas e anúncios em catadupa em jornais lisboetas e nos suplementos do costume. Não duvidem. Como diz David Lescot – dramaturgo francês de origem polaca, vivíssimo – sobre estas coisas de capitais em A Europeia (publicada na colecção dos Artistas Unidos/Cotovia, tradução de Isabel Lopes) pela boca do performer português Quim Calisto, participante de uma capital europeia: “Primeiro tocam a reunir: Capital europeia da cultura, capital europeia da cultura, isso chama os esfomeados locais […] Mas quando se trata de chegar a uma conclusão, quando começam as festividades […] ficam só com um…”
O problema aqui é tão absurdo que é como manter um oásis de espelhos virados uns para os outros no meio de um sismo que se generaliza. O que deverá ser uma capital europeia sem Europa e pensada do lugar da crise? Vamos continuar a fingir que não se passa nada, como na anedota do período Brejnev em que, fechando as cortinas do comboio, todos se abanavam para fingir que estavam em movimento? Já chegámos a esse ponto becketteano?

fernando mora ramos

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

O lagarto sem sorrisos

Gala-gala anda escondido de patas partidas ou a moer convalescenças antigas
afinal também descolonizou tem crise de mosca não sei bem sei não tem crise de mosca e tem crise de melga não sei bem o que sei é que é raro mais muito mais que era nos tempos
e mesmo perdeu cor a cabeça era cor de papagaio em lagarto e era articulado cabeça articulado como marioneta gala-gala era repentes língua comprida e avenida corrida em tronco de árvore directamente a pique nas nuvens gala-gala não tem o inverso psico-somático da vertigem na cabeça corre ao contrário da queda nem Newton resolve pelo contrário só a gala-ciência explica e é descomplicado explicar mas essa não tem prestígio tem mezinha tem curandeiro tem feitiço e tira asma com raiz de molho tal como bacalhau e por essos razão a ciência não descortina pois a ciência só descortina com laboratório e gala-gala é inapanhável em LABO: tem horror da proveta e tem horror da luneta que microscopiza a gente pondo na gente na sua foto tipopasse em célula primogénita de sorriso amarelo microscópico em forma de piolho ainda mais piolho micro-piolho nem dá para coçar
pois tem cola no gancho do pé pata e isso explica o a pique no tronco a pata agarra como unha de gato dúvida: gala-gala tem unha de gato?
em qualquer tronco vai qualquer tronco é canja mas melhor na Acácia usa a grande mãe Acácia mãe de todas as avenidas árvores mãe Acácia e mais quando florida pois equação é: fodida florida o hífen é incorporado na metamorfose: metamofoda
desconhecida a anti-vertigem congénita antídoto implementada na imuno-eficiência
muito mais desconhecida que as crateras de Marte reconhecidas
cola a tudo a palma do pé e olha que as crateras de Marte mesmo maningue são maningue longe mais que maningue nices que também são pois fazem lembrar o que se chama paisagens lunar e essas são nices pois são vazias e precisamos de vazio que isto está cheio basta olhar as periferias pois nos centros estão cheios mas é de pasta a matéria dos bancos da meia dúzia
são longe de conhecer os galas mais que muitas voltas ao globo que é onde estamos e onde o gala-gala está também: somos vizinho desde as infâncias de cada um: eu no apartamento e ele na árvore minha janela dava para a árvore dele e a árvore dele dava para a minha janela lagartávamos os dois de madrugada eu sonhava na almofada o truque das estrelas acesas e ele hibernava efémero nas bordas de uma pétala de Acácia a nossa Acácia só nossa
dia de trabalho não dá para hibernar como antes dos tempos hibernava pouco coitado
e comia arroz de segunda como cão a trinca de primeira
os tempos trouxeram horário sabes o que é horário?
Que diz a ciência:
somos a biologia global gala-gala primeiro que sapiens pois gala-gala sobreviveu à implosão dinossaura: fez-se pequenino pequenino e passou despercebido na glaciação tal como o camelo sem as bossas no buraco da agulha
sei muito bem que a agulha é feminino e o gala-gala também e por isso alça a cabeça ao topar com ela e ganha cor como o outro eriça as pluma sempre que pensa na agulha eu nunca vi gala-gala menina é uma falha cultural mas foi-me transmitido que não coloria cabeça coloria antes entre as pernas também é muito bonito
tenho uma maldita dúvida: tem mesmo hífen? E será onde: entre o corpo e a cabeça? Hífen incorporado pois gala-gala nada de pescoço nem que tem sequer um arremedo mas não tem medo abre a boca e faz um fzzzzssszzzrrre maior que gato arranhado
eu acho que as mosca aquelas mosca que foi criada pelas lixeiras morais escolarizadas comeram o gala-gala e só deixaram lagartixa porque lagartixa é mais inapanhável ainda e mais secreta mais humanizada gala-gala fica de pasmo pois tem costela ingénua de boi para palácio e aí a mosca lança o dente a mosca pequenoburguesa é lixada e na crise mata o mano e a mãe quanto mais o gala-gala
comeram-no extinguido só falta decreto
o carapau não sabe

Benjamim Saguate Chicuembo
primo alargado de Xico Nem Saguate (dos Saguates Nem da Manhiça)


CROCODILO DE FRENTE

Pintura Joâo de Azevedo

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

D’ hoje e de quinhentos

Não, nada de crise, não pesco. Já tem quinhentos anos, desde que a pedra grande na linha do horizonte nos vê, no cais que não era cais mas mato, o cafre de azagaia, meu primo, no cimo da duna, mais de gala-gala que enraivecido que de gente, nunca foi diferente – linha do horizonte a gente tem no olho e usa quando pode olhar o longe, menos vezes que costuma, pois costuma olhar o perto, dia a dia, o perto, o esperto é quem manda e esse olha longe, mesmo o porta-moedas, o esperto vê-o cheio quando está vazio, a gente não, a gente amocha, a gente tem que não tem, o nada na mão tem. A gente crise sempre, desde os tempos. Quando meteram pé na areia só olharam a vantagem, a mamita, a marmita, o rabito, o entre pernas e outras guloseima, mais a vantagem das tenças, terra por missanga, a vantagem da barriga contente bater palmas com a planta dos pés, a vantagem da bunda prateleira além de rego livre faça favor, a bunda, assim mais mesmo mais virada para a lua, como cão, sem vergonha, só tesão e fenda na perspectiva. Tesão é arte, de artesão e faz com trabalho manual e anal e mesmo pela frente, como for, de alto ao chão dos pés e de cima para baixo e vice-versa.
Contaram assim mesmo: agora é crise, grande. Não que não sei, sei mesmo da mesma. Já o tinha, a crise, sempre foi meu, ela. De manhã crise: a crise do mata-bicho. No meio do dia crise, o almoço fora do prato, nem prato, nem almoço, só talher e aí imaginavas, cheiravas o porvir. Não vale sequer brincar ao jantar. Talher sim, herança colonial. Talher completo: faca, colher de sopa, garfo, colher de sobremesa, garfo minhoca, e prato – nunca cá percebi porque a colher uma era sobremesa e outro era grande, sobremesa era tudo e sob a mesa era perna e pé, sapato ou chinelo.
Prato azul de plástico, prato de plástico dura sempre, é como santo, não parte, santo de S. Já viu santo de S partir, partir assim como loiça? Sem Santo não tem milagre. E milagre é mezinha da crise. Põe milagre na crise e comes. Foi o que fiz. Pus milagre, assim um pouco, para não gastar todo, como gotas, a conta-gotas e a crise emagreceu, emagreceu ao ponto de me engrossar. Pouco, muito pouco, assim como a pele do tambor esticada a aumentar o umbigo, umbigo grande mas sem dentro, umbigo de esticado, não como a pele do tambor lassa, nada disso. Às vezes vai para dentro. Encolhe, mete-se dentro. Já viu barriga encolher? Encolhe, barriga encolhe. Única coisa que não encolhe é fome.
Já viu daqueles famintos a passar o mar e a ficar? Pobre é alimento. Mesmo quando só é osso alimenta, alimenta o mar que nunca pára de fazer cemitério e não pagas, não pagas nada, nem o pedaço de terra. E lá em Lampedusa continua, comes piza e voltas para trás, para o sítio da fome, despejado. Aqui não é assim. Aqui estamos na crise há mais de quinhentos anos e continuamos – quinhentos anos mais trinta e tais. Aqui a crise é como o ar que respiras, respiras crise e é por isso que quando respiras sentes a crise, pois ela entra nas narinas e toca no estômago a música dos ossos erodidos. Os ossos ficam em cornucópia quando a carne é pouca. Os ossos lassos ficam moles, como o que está por fora do pezinho de porco, aquela gelatina, aquela coisa mole que estica e contrai, mas não é a mesma coisa porque quando aperta a crise diminui mesmo a moleza que encobre o tutano até ficar zero. Tutano não conhece, a gente. A gente conhece osso e gelatina quando vai para velha. A crise sempre que esteve connosco. Sempre, sempre, ao lado do povo. Por isso quando fala crise a gente não estranha, a gente conhece. A crise é nossa prima e direita, e endireita sempre a gente.

Xico Nem Saguate

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

E se a minha avó tivesse rodas?

"Se em 1980 PS fosse como hoje, Sá Carneiro era PS"José Miguel Júdice, DN



TRÌADE CROCODILIANA

Pintura João de Azevedo

Novidades no Javali Sentado

Textos de Adansónio Digital e de Xico Nem Saguate.
Crocodilos e harragas (aqueles que queimam os seus papéis, em árabe. Emigrantes no Mediterrâneo, atraídos pelas luzes dos países europeus e das possibilidades de trabalho) de João de Azevedo.
O Verão promete.

London on fire


O Senhor Z. na era da globalização

O Senhor Z. jantava diante do televisor, como era normal. Estava ele a mastigar um bocado particularmente rijo do guisado quando os motins lhe irromperam pela casa dentro. Tinha mamado uma série de entrevistas a três ministros, a quatro secretários de Estado, a sete (ou seriam oito?) deputados, a uns quantos banqueiros e a um ex-presidente já xexé. Uma canseira! E ainda ia ter de ruminar as pérolas de sageza de vários misters e de um desfile de jogadores colombianos, todos conscientes das dificuldades do desafio, mas certos da vitória. Tudo normal. Mas seria de facto normal? O Senhor Z. recordou-se que o seu pai, o Senhor B., lhe tinha ensinado, muitos anos atrás, que era preciso questionar a normalidade antes de a aceitar, tentar perceber a quem ela servia. Mas a verdade é que, com o passar dos anos, o Senhor Z. tinha praticamente esquecido o salutar conselho paterno, a braços que se via com as preocupações normais de um desempregado, um daqueles que todas as manhãs hesita antes de abrir a caixa do correio, com medo de lá encontrar uma cartinha do banco, ou das Finanças, ou da Segurança Social, ou da Cofidis, ou… Por isso, foi apanhado de surpresa pelas imagens de Londres a arder, pela orgia de transgressão, pela festa dos que não têm outra festa senão, de quando em vez, a vertigem da liberdade sem entraves. O Senhor Z. quase se engasgou. Subiu o volume do televisor e chamou a mulher. “Olha para aquilo, Maria!” A mulher, que estava ocupada na cozinha, deu uma olhada, espantou-se e comentou: “Uma coisa destas aqui na Europa não é normal.”

Adansónio Digital

segunda-feira, 8 de agosto de 2011


Desenho Robert Crumb

“Uma pequena reflexão de Verão" no Facebook

Mensagens de férias:
Sacrifícios pedidos aos portugueses não vão ser suaves, avisa Passos
Público

Aqui no JAVALI SENTADO achamos que o homem deve ir para a Sorbonne. Aproveitamos para perguntar se alguém sabe de onde surgiu tão curta e profunda reflexão.

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

O pior do Crato

Estimados javalis…me penitencio pela ausência. Pois que me comprometera no esbulho do Crato, mas tenho de lateralizar como um sendeiro. Assim, e dada a simpática pressão do nosso webmaster, proponho uma alternativa infeliz do tipo “a entrevista possível”. Entre o cronista da miséria e a miséria do cronista.

A verdade é que ‘passo’por duas razões. Primo, o Nuno Crato é com toda certeza a distinção deste governo a Passos. (Uma laranja de Éfeso). Secondo, este blogue conta com especialistas na cousa educativa, quer como vítimas quer como carrascos.

Portanto...apenas posso sublinhar que aparentemente o Nuno Crato excomunga a tendência dominante do governo PPD/PP: um deprimente poujadismo. Já não é mau.
E no domínio da praxis terei de salientar uma proeza do Crato: recebeu o Nogueira da Fenprof e logrou levar a conversa até ao fim sem o esbofetear, metaforicamente, claro, que isto é gente de brandos costumes e muito respeitinho.

Lembrem-se que podia ser pior. Considerem a nota enviada às redacções, todas, jornais, revistas, webpages, pelo ‘departamento de publicidade’ do PCC, no seguimento do acidente ferroviário à grande vitesse em Wenzhou: “you are not allowed to publish any reports or commentaries, except positive news or information released by the authorities”.

Perguntarão os perspicazes javalis que ‘positive news’ haverá numa catástrofe, exagero, meu, que levou umas dezenas de vidas? Ora, tão positivas como o saldo de um conversa com o Nogueira.

JSP aka XicoNhoca.come

PS: Soubéramos nós, Javali Sentado, que o BPN ia por 40 milhões, e até nos levantámos numa de corporate raider. Certamente, arranjaríamos o caroço junto de qualquer cartel, seita, benevolato ou alterne. Para a próxima estaremos amis atentos.

Completamente à rasca

Dream a Little Dream of Me

Ella Fitzgerald

Há caracóis

Prego no prato
Alprego
Alprego com hortelã arrependida da burka
Prego no pão
Prego simplesmente
Prego! O senhor primeiro
Prego à Hambúrguer
Prego duplo
Prego à casa
Prego à maneira
Prego tipo francesinha à moda da Regaleira
Prego tipo francesinha com molho especial de ketchup caseiro
Prego cachorro
Prego de triplo andar entremeado de folhas de alface aviteladas
Prego à cachorro com salsicha singela de origem lusa
Prego com dupla salsicha à maneira do pequinês de latido agudo
Prego com salsicha familiar e vistas para meia melancia em quarto crescente
Prego enferrujado reserva
Prego a fundo
Prego mal passado com escoriações ligeiras para dar cabo das estatísticas só negras
Prego sem cabeça
Prego afiado de nervo para dentes adultos canino humanóides
Prego com presunto fatiado pata negra directamente da Estremadura mole para o seu dente
Prego de aço para todas as situações conflituais globalizadas locais
Prego Glocal
Prego para placas das antigas sem semáforo
Prego trinchado
Prego de carne moída de vitelinha barrosã arrependida
Prego para ocasião solene
Prego à Lisboa repassado com banha da província
Prego alentejano à moda de Beja com carne de alguidar a fazer de pão e pão a fazer de bife
Prego açorda
Prego ocasião
Prego semi-novo
Prego de rebaixas com fiambre parecido com mortadela verdadeira
Biprego à maneira da silly season movendo-se pela sombra até ao objectivo final
Prego vegetariano com e.coli excomungada e tofu do autêntico por cima
Prego Made in China
Prego em pão de forma ao carvão
Prego de micro ondas com experimentada natação
Prego surfando na primeira boca aberta de caninos em serrilha
Prego misto com exterior reforçado de carcaça tostada ao carvão e molho duro
Prego com molho de pica-pau
Prego picante
Pregoetcetera e tal com picante soft esmaecido em cama de vitelinha amaciada
Prego de adrenalinas várias
Prego para ponta alta com valor nutritivo do tipo ginseng
Prego de pontas
Bifana

Emílio Navarro Soler

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Desse jeito nenhum homem te aguenta


Cesar Menotti, Fabiano - Ciumenta


Post dedicado à concorrência “que nos intervalos vem estacionar neste balcão esquadrinhando os seus posts e comentários com a minúcia que, imaginamos, o Santo Ofício terá dedicado aos textos de Giordano Bruno antes de o mandar (com toda a lógica) para a fogueira”. Aqui não aconselhamos leituras, mas também damos conselhos.

Desenho Grosz

O novo PREC

É ao que assistimos, uma catadupa de medidas empurrada por um falso horizonte. A fugir da dívida caminhamos para o abismo. E as medidas sucedem-se: aumentos impensados nos transportes a fazer o frete ao uso e abuso do carro privado, meio subsídio de natal calculado não a partir do subsídio de natal – há muita gente que não o tem, nem de natal, nem de férias –, mas a partir dos valores do IRS declarado dividido por catorze, duzentas e trinta nomeações com dupla transparência a multiplicar a transparência por dois (Internet e Diário da República) no espaço de um mês – excelente média e despesa, imagina-se -, liberalização do uso da gravata no MA, um Secretário de Estado sem assento no Conselho de Ministros, o da cultura, orçamentos rectificativos pré anunciados ao serviço das necessidades de crédito do sistema banqueiro, avaliação dos professores a manter-se para já, TGV para as urtigas, frente ribeirinha lisboeta logo se verá, e mais uma série de medidas na lógica do corte – nem todas péssimas claro, só está em causa é o seu recorte -, com o assunto das secretas a dar o toque República das Bananas, pois não nos podemos esquecer desse luxo de condição cómica que é ser periférico e há que praticá-lo lançando tragédias de irrelevância nas ondas de choque do real de modo a que este se note menos.
E convenhamos que há um real que está indexado, por assim dizer, ao balanço dos transportes públicos e um outro que se anuncia no ranking das 10 maiores fortunas portuguesas, com a cortiça a vir mais que ao de cima, a voar mesmo. É interessante conhecer este sistema de vasos comunicantes perfeito: o menos que tu tens é o mais que outro acumula e se apertas o cinto, tu e uns milhões, outros multiplicam os patrimónios e as rendas e o muito A mais que têm - não há aqui regulação alguma segundo lógicas de necessidade vindas de um centro de racionalidade humano e técnico chamado governo, nem princípios de solidariedade institucional, nem nada que o explique que não seja a força bruta do dinheiro a agir através dos seus mandantes e dos seus mandados. E nestas fortunas, lucros acumulados em espiral ilimitada, e não o tal dinheiro que regressaria à economia investido – o sentido de lucro não é esse – não se divisa a mínima crise, pelo contrário, a crise é o melhor que lhes pode suceder, comem do acrescento de miséria dos outros e comem dos lucros da especulação, comem por duas vias: pela austeridade que é mais capital para eles e dos capitais em bolsa, riscos geridos e protecção mais que acautelada contra estes, pois também mandam nos riscos.
É um novo PREC, o Processo de Regressão Em Curso, pois este grau de “austeritarismo” é de facto absolutamente radical na sua cegueira e não mede nem as necessidades de alargar as sopas dos pobres ao número do seu aumento exponencial. O que sentirá um democrata cristão? Não fundamentalista, claro. Sentirá pena, compaixão, rezará pelos desempregados que agora lança na miséria? Quantos Pais Nosso? O Senhor tem um plural minguado! Quantos céus necessitarão invocar perante tanta dor evitável?
Em boa verdade o capitalismo puro e duro que aí está não vai resolver nada, nem a crise, nem as mentiras da crise e são múltiplas e engordam os porcos – era assim que os desenhava Grosz.
Pois a crise não é a da dívida. Questões de dinheiro sabemos nós que se resolvem – há várias provas históricas de saídas de crises bem mais complicadas, esta tem interesses próprios, por assim dizer -, o que não se resolve é a sua distribuição errada, o enriquecimento ilícito de uma minoria que fabrica as suas próprias leis, sistemicamente instalada como proprietária do modelo de organização sócio económico, regime parlamentar representativo da liberdade específica de agir dos poderes financeiros dominantes, o reverso oculto da democracia, aquele que contra ela milita – entre o mercado e a democracia há interesses opostos: um visa a acumulação de lucros intransparente na mão de um menor número de competidores que vencem, a outra visa a igualdade de direitos, a transparência, a distribuição equilibrada dos meios de vida, a generalização da cultura artística e científica, finalidades humanas através da fruição quotidiana na cidade daquilo que são os ricos patrimónios vivenciáveis da cultura ocidental, desde a diversidade do legado grego aos avanços da tecnologia, isto sem endeusamentos burros (o que é tecnológico será sempre submetido a usos e não virtuoso em si como sonhará um tecnocrata cego pelos ecrãs).
O problema é a nova religião, o dogma, indiscutível, a dívida nova fé, um caminho a seguir cegamente na sua resolução: “eles é que sabem”, diz o analfabeto financeiro, nós, pensando nos tais economistas e gestores que finalmente a criaram, á dívida, com um carinho pseudo-científico – afinal são tudo narrativas e o futuro é uma incógnita. Sabem o quê? O dogma da economia do crédito mata a democracia. A “creditarização” da economia é em si uma velha fórmula e pela taxa alta matou a sua utilidade, transformando-a num garrote. Os usurários que habitavam no Século XVIII nas imediações da Ponte do Rialto já tiravam partido de uma aplicação extremista da usura para fazer crescer os patrimónios respectivos sem limite, principalmente o fundiário. Em Os Rústicos, do grande Goldoni, já um deles confessa: “quando me perguntavam se queria ver o mundo através da luneta ou amealhar as duas moedas eu preferia guardá-las”. Pois é, como dirá um imbecil, eram mais espertos e isso é o mérito. Falta saber onde é a vida. Há sempre, pelo menos, duas perspectivas antagónicas e depois há todas as outras.


fernando mora ramos